C,T&I precisam estar mais presentes no Parlamento, afirmam debatedores na SBPC

Reconstruir pontes, participar do processo de tomada de decisão e levar a política para as universidades e instituições de ciência e tecnologia. Esses foram alguns dos encaminhamentos ao final do painel “C,T&I no parlamento” realizado nesta quarta-feira (27) na 74ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que acontece em Brasília. Entre as discussões acerca da atual política nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (C,T&I), os painelistas apresentaram propostas para reverter o quadro de baixa atenção do governo federal ao setor.

Para o presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas (Fapeal) e secretário-executivo da Iniciativa para a Ciência e Tecnologia no Parlamento Brasileiro (ICTP.Br), Fábio Guedes Gomes, o futuro da C,T&I está diretamente ligado às eleições de outubro. “É necessário que a gente eleja aqueles que têm compromisso com a ciência e a tecnologia, além de estreitarmos o relacionamento com os bons parlamentares tanto no Senado como na Câmara dos Deputados”, disse Guedes, que coordenou o painel e apresentou análises sobre o tema tratado.

De acordo com o presidente da Associação Nacional dos Docentes das Instituições Federais (Andifes) e reitor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Marcus Vinicius David, também integrante do painel, as eleições são uma oportunidade para que a sociedade conheça o projeto de desenvolvimento da Nação defendido por cada candidato. “Valorizar projetos que tragam a C,T&I como eixo estratégico para o desenvolvimento é muito importante. Temos uma chance de entender o que será prioridade”, avaliou.

Durante sua apresentação, o secretário-executivo da ICTP.Br alertou ainda que é preciso difundir entre o meio acadêmico e científico os impactos das propostas discutidas no Congresso Nacional. É o caso, por exemplo, da MP 1.112/2022, que cria o Programa de Aumento da Produtividade da Frota Rodoviária no País. Apelidada de MP da Sucata, ela visa retirar de circulação veículos de carga com mais de 30 anos de uso.

“A medida é até meritória. O problema é que o governo quer financiar o programa com recursos que as empresas concessionárias que exploram poços de óleo e gás destinam a projetos de P,D&I”, alertou Guedes, ao defender uma mobilização do setor pela mudança do texto. “Há instituições de ciência e tecnologia que desenvolvem projetos com esses recursos e que não estavam sabendo do impacto que essa MP trará se for aprovada da maneira como está redigida”.

Entre 2019 e 2021, mais de 2,6 mil projetos foram contemplados com os recursos oriundos dos contratos entre a Agência Nacional do Petróleo e Gás e as empresas concessionárias. “Os recursos contemplaram 95 instituições de ciência e tecnologia de todo o país que desenvolvem projetos densos que podem levar o Brasil à fronteira do conhecimento não apenas no setor de petróleo e gás, mas também em áreas como energia renovável”, explicou Guedes.

Investimento e governança

A crise do setor de ciência e tecnologia também foi alvo de análise dos painelistas. O reitor da UFJF atribui os baixos investimentos em C,T&I à falta de uma política de desenvolvimento nacional. O atual modelo brasileiro, segundo ele, está focado na redução dos custos da mão de obra e na superação dos custos ambientais. “Esse modelo não é mais aplicado nas nações que estão na fronteira do conhecimento. A alternativa é construir uma política focada na base industrial responsável ambientalmente e que fortaleça a mão de obra”, avaliou. “O novo parlamento e o próximo presidente da República precisam mergulhar nesse projeto de Nação. Se tivermos clareza nesse caminho a ser trilhado, as estratégias de C&T começam a fazer mais sentido”.

Marcus Vinicius apontou ainda a necessidade de mudanças nos mecanismos investimentos e na política de governança do setor. Ele defendeu que a Emenda Constitucional 95, que estabeleceu o teto de gastos, seja revista. “Isso trouxe um estrago para todas as estruturas de Estado. As despesas obrigatórias, como é o caso do pagamento de pessoal, seguem aumentando. Isso tira o poder de investimento das instituições. Somado aos cortes e contingenciamentos, estamos vivendo a mais grave crise no financiamento da educação básica, da educação superior e da ciência e tecnologia, comprometendo o desenvolvimento da Nação”, lamentou.

O reitor avalia que deputados e senadores terão um grande desafio para dar fim à burocracia e garantir segurança jurídica na parceria entre a academia e o setor produtivo. “O Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia e a Política de Ciência e Tecnologia deverão ser novamente analisados. E neste momento será crucial construir um modelo onde todos os atores tenham um papel estratégico e equilibrado”.

Cortes e resistência no parlamento

Em vídeo gravado para o painel, a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ) destacou que senadores e deputados têm sido fortes aliados do Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia. A parlamentar avaliou que o Brasil abriu mão do desenvolvimento e da soberania nacional ao menosprezar a ciência e aceitar o papel de exportador de commodities e importador de produtos de alto valor agregado.

“Temos uma biodiversidade que nos permite pensar em liderar o mercado de fármacos e um potencial enorme na geração de energia limpa, mas tudo que foi construído está sendo desmontado por um governo que não consegue conviver com a liberdade de pensar”, disse.

Em 12 de julho, lembrou Jandira, o Congresso Nacional deu uma demonstração de respeito e compromisso com a ciência brasileira. Por apenas 10 votos de diferença, 197 a 187, os parlamentares não aceitaram o texto original do PLN 17/2022, que extraía do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) R$ 2,5 bilhões para remanejá-los para outras áreas. A proposta do governo federal contrariava a Lei Complementar 177, que proíbe contingenciamento do principal fundo de apoio a projetos de pesquisa e desenvolvimento do País.

Para o secretário-executivo da ICTP.Br, a rejeição ao trecho do PLN 17 foi uma vitória importante para a comunidade científica, diante de tantas adversidades. “Estamos sendo sufocados em várias frentes. Há cortes nos repasses para as universidades, redução dos orçamentos dos ministérios da Educação e da Ciência, Tecnologia e Inovações e ataques frontais aos mecanismos de financiamento da pesquisa”, afirmou Fabio Guedes.

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