União libera R$ 19 milhões ao Ipen após suspensão de produção de remédios para pacientes com câncer; valor é 21% do necessário

Uma portaria publicada em edição extra do Diário Oficial da União nesta quarta-feira ( 22) liberou R$ 19 milhões para o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), segundo divulgou o Ministério da Ciência e Tecnologia, 21% dos R$ 89,7 milhões necessários para que o instituto continue sua produção até o fim do ano.

“A portaria permitirá a compra imediata de insumos importados para regularizar a produção dos radiofármacos”, disse o ministério, em nota. O Ipen disse que ainda não foi informado do repasse.

Por falta de verba, o órgão, que integra o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), paralisou na segunda (20), por tempo indeterminado, a produção de radiofármacos e radioisótopos usados para o tratamento de câncer no Brasil. O Ipen está sem recursos para continuar a produção dos insumos usados para a detecção e o tratamento de câncer, após um corte de 46% da verba do instituto pelo governo federal em 2021.

Com caráter emergencial, o texto é uma alternativa mais rápida para complementar os recursos do IPEN”, disse o ministério em nota. “O Governo Federal vem atuando desde junho de 2021 em conjunto com Congresso Nacional para a recomposição total do orçamento do Instituto. O PLN 16/2021, previsto para ser votado na próxima semana, disponibilizará recursos ao IPEN no valor de R$ 34 milhões. A aprovação de um novo projeto de lei, da ordem de R$ 55 milhões, será necessária posteriormente para recompor o orçamento do Instituto até o fim do ano”, informou.https://b7d93147febf333f9fe2dd53cb2a88fd.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html

Também nesta quarta, a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo enviou um ofício ao Ministério da Saúde pedindo providências para evitar o risco de interrupção no tratamento de pacientes com câncer, que dependem de remédios produzidos pelo Ipen.

Segundo o governo de São Paulo, mensalmente, cerca de 14 mil procedimentos são realizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) com dependência de radioisótopos e radiofármacos que estão em risco de desabastecimento.

“Estes procedimentos incluem mais de 70 sessões mensais de iodoterapia realizadas para tratamento de câncer em São Paulo”, diz o estado.

Também são feitos, em média, 750 exames de PET-CT, um tipo de tomografia computadorizada para diagnóstico da doença, além de 13,5 mil cintilografias ósseas e cardiovasculares, entre outras, utilizadas para detectar doenças como isquemia, infarto e embolia pulmonar, além de patologias relacionadas a tireoide e próstata todos os meses e que dependem da produção do Ipen.

Radiofármacos no Brasil

O Ipen é responsável pelo fornecimento de 25 tipos de radiofármacos aos laboratórios e hospitais de todo o Brasil. Cerca de 85% de toda a produção nacional desse tipo de medicamento, com material radioativo, sai da unidade.

Para a tarde desta segunda (20), está prevista a entrega do último carregamento de Iodo-131, usado na detecção do câncer de tireoide. Depois, ninguém sabe quando será o próximo. Pacientes com câncer e médicos ouvidos pelo Jornal Hoje narraram que já enfrentam falta de medicamentos por causa da escassez de produtos.

No ano passado, a verba repassada ao Ipen pelo governo federal foi de R$ 165 milhões. Neste ano, até agosto, o instituto recebeu pouco mais de R$ 91 milhões.

Em carta enviada na semana passada aos hospitais e laboratórios que consomem os produtos do instituto, o Ipen afirmou que ter feito um pedido ao governo para a aprovação de recursos extras no valor de R$ 89 milhões. A verba, no entanto, precisa passar por aprovação do Congresso Nacional e, depois, por sanção presidencial.

“Estão faltando mais de R$ 70 milhões para a gente terminar o ano. Sem contar a valorização do dólar, porque tem uma boa parte de insumos que são importados. Então, já era uma situação prevista e que vinham tentando brigar para reverter”, afirmou o diretor do Sindicato dos Servidores Públicos do Ipen no estado de São Paulo, Luiz Antonio Genova.

Falta de medicamentos

Os radiofármacos produzidos pelo Ipen têm duas funções. Uma é o tratamento em si que, no caso de alguns tipos de câncer, são a única opção. Outra é o diagnóstico por imagem – exames que ajudam a detectar a presença do câncer e de outras doenças, como Alzheimer.

Faz um ano que a gerente financeira Tatiana Mendonça descobriu um tumor neuroendócrino, um tipo raro de câncer que atinge o pâncreas ou o intestino. O primeiro tratamento não deu certo e a alternativa, agora, é uma medicação da categoria dos radiofármacos que são fornecidos pelo Ipen.

Tatiana começaria o novo tratamento na terça-feira (21), mas o remédio que ela precisa está em falta.

“[O tratamento] é longo porque o intervalo leva oito semanas para cada aplicação. Assim, vai me atrasar bastante, e tudo que a gente pudesse fazer antes, seria melhor. A gente trabalha contra o tempo. Mas a gente não tem nenhuma previsão de quando vamos poder iniciar [o tratamento]. A gente não sabe se vai ter, se eu vou precisar fazer de alguma outra forma ou se vai dar tempo… Então a gente fica bastante preocupada”, afirmou.

O desabastecimento causado pela paralisação no Ipen pode afetar cerca de 2 milhões de pessoas em todo o país, segundo a Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear (SBMN).

“Nós temos pacientes com problemas de câncer no pâncreas e no intestino que podem ser tratados com uma medicação que chama lutécio. O lutécio também esta em falta. Tenho três pacientes no hospital que trabalho que eu trataria nesta semana, mais especificamente amanhã. Mas tive que cancelar porque essa medicação esta em falta”, afirmou o médico Dalton Alexandre dos Anjos, diretor da SBMN.

“Não sei o que falar pra esses pacientes. É tão ruim falar para eles que o tratamento não pode ser realizado porque a medicação está em falta”, completou.

Pedido de investigação do TCU

O deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) pediu na sexta-feira (17) ao Tribunal de Contas da União (TCU) que investigue a paralisação da produção de insumos pelo Ipen.

“É uma combinação macabra de desprezo à vida: ao cortar recursos para a produção de medicamentos e insumos para diagnósticos, com a ganância do lucro, ao ensaiar abrir este setor para interesses privados”, afirmou o parlamentar.

No pedido feito ao TCU, o deputado federal Alexandre Padilha, que é membro da Comissão Externa da Câmara dos Deputados que discute ações contra o avanço do novo coronavírus, afirma que “a medida é imprescindível para a saúde pública no país”.

“A compra de insumos usados na radioterapia e nos exames de diagnóstico por imagem no tratamento do câncer não pode ser paralisada com a justificativa da pandemia do Sars-Cov-2. Tal possibilidade revelaria uma completa incompetência e má gestão do órgão público que afetaria diretamente entre 1,5 e 2 milhões de pessoas em todo o Brasil”, afirmou o documento do parlamentar.

O parlamentar também protocolou na Câmara dos Deputados um requerimento para que o ministro Marcos Pontes, do MCTI, seja ouvido pela casa e preste esclarecimentos sobre os cortes de verba do Ipen.

O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) afirmou na quinta (16), por meio de nota, que “desde junho de 2021 vem trabalhando com o Ministério da Economia para a maior disponibilização de recursos para a produção de radiofármacos pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN)”.

“Para a recomposição do orçamento do Instituto, o Governo Federal por meio do MCTI está sensibilizando o Congresso Nacional pela votação e aprovação do PLN 16/2021 prevista para a próxima semana”, disse a nota da pasta.

Paralisação no Ipen

O Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) anunciou na terça-feira (14) a suspensão da produção de produtos radiofármacos e radioisótopos usados para o tratamento de câncer no Brasil.

Em comunicado enviado aos serviços de medicina nuclear brasileiros que compram os produtos do Ipen, o órgão afirmou que precisa de R$ 89,7 milhões para continuar a produção dos insumos até o fim de dezembro deste ano, entretanto, a verba ainda não foi aprovada no Congresso Nacional.

“Enfrentamos a grande redução dos recursos atribuídos pela Lei Orçamentária Anual (LOA) à CNEN e à forte e desfavorável variação cambial, em 2021. Visando à recomposição dessas perdas orçamentárias, o IPEN-CNEN, com o apoio do MCTI, trabalharam fortemente junto ao Ministério da Economia (ME), desde o 1° semestre deste ano. Entretanto, esses créditos suplementares de R$ 89,7 milhões, programados na forma de Projeto de Lei, necessitam de aprovação no Congresso Nacional e sanção da Presidência da República”, disse o instituto.

“O fato desses recursos orçamentários extras ainda não estarem disponíveis no Instituto, até o momento, implica na inexistência de lastro em crédito orçamentário. Nesse sentido, a impossibilidade nas aquisições e contratações pelo IPEN-CNEN, implicará na suspensão temporária da produção dos geradores de 99Mo/99mTc e dos radiofármacos provenientes de iodo-131, gálio-67, tálio-201 e lutécio-177, dentre outros, a partir de 20/09/2021”, afirmou o comunicado da entidade.

A suspensão na produção vai afetar diretamente o tratamento de câncer no Brasil e o diagnóstico da doenças, já que os materiais do Ipen são utilizados no tratamento de câncer e em exames de imagem, como raio-x, tomografia, ressonância magnética, cintilogafia e mamografia, entre outros exames que são essenciais para o diagnóstico de doenças no Brasil.

Segundo a Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear (SBMN), o Ipen fornece 85% dos radiofármacos e radioisótopos utilizados no país, o que pode prejudicar cerca de 2 milhões de pessoas.

No comunicado enviado às clínicas e hospitais brasileiros, o Ipen reconheceu o problema e disse que já é do conhecimento do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCTI), presidido pelo ministro astronauta Marcos Pontes.

“O IPEN-CNEN, a CNEN e o MCTI entendem perfeitamente, de forma solidária, que a ausência temporária dos geradores de 99Mo/99mTc e dos radiofármacos aos hospitais e às clínicas no País, resultará em transtornos familiares de grande monta. Sobretudo, nos pacientes que necessitam de atendimento, e que têm seu procedimento de Medicina Nuclear interrompido, seja este pelo SUS ou via Sistema de Saúde Suplementar”, afirmou o instituto.

O Ipen afirma que esgotou todas as possibilidades de diálogo com o governo federal para ter mais verba e não paralisar a produção, mas que não teve sucesso.

“Acredita-se que essas instabilidades nas produções de radiofármacos sejam apenas por poucos dias, com a obtenção dos créditos orçamentários suplementares de R$ 89,7 milhões, ao IPEN-CNEN. (…) O IPEN-CNEN e a CNEN esgotaram todos os meios para que se evitasse a descontinuidade, recebendo inclusive assessoria da Advocacia Geral da União (AGU), nesse contexto”, declarou o comunicado do instituto.

Fonte: G1

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